Lisboa das Sete Cidades - V

2004-09-26 (Domingo)

Percurso Pombalino

(texto da actividade da autoria de José Luís de Matos).

A Cidade Nova de Pombal não se reduz às Baixas Pombalinas. Há uma periferia paradigmática que vai da área de S. Paulo, fabril e portuária, pela rua do Século, onde está o palácio de família de Pombal, dos Carvalhos, tendo à esquerda e à direita dois centros pombalinos de intervenção ideológica, o Convento dos Caetanos e o Convento de Jesus, e do lado norte a fábrica e o palácio Ratton, símbolo dos suportes económicos do regime. Passado o Alto do Longo, já na “Cotovia”, o Colégio dos Nobres (Faculdade de Ciências) que foi peça fundamental na requalificação da nobreza. No termo do percurso, as “artes” fabris do Rato e das Amoreiras.

A produção fabril inicia-se na prática com Pombal, alterando o tecido económico português que fora, até finais do século XVII, em exclusivo agrícola e comercial. As indústrias pombalinas localizam-se nos aterros de S. Paulo e nas periferias do Rato, numa cidade que, começa a abandonar a Ribeira e se interioriza. Lisboa inicia a subida ao planalto interior.

Há começos de urbanização das áreas do Rato e da Estrela nos começos do século XVIII que decorrem do projecto megalómano dos Palácios Reais Joaninos que viriam a situar-se entre o “Senhor da Boa Morte” e “S. João dos Bem Casados”, entre o cemitério dos Prazeres e as Torres das Amoreiras actuais.

Do projecto primitivo resta hoje o Aqueduto das Águas Livres (canalizações, Mãe de Água, Chafariz do Rato, e pouco mais) mas as infra-estruturas implantadas permitiram conceber e organizar o espaço industrial pombalino, com as fábricas das sedas, cerâmicas, pentes, etc., e as correspondentes habitações de trabalhadores, e iniciaram uma dinâmica urbana que se desenvolveu até à nossa época.

Os povoados operários foram, desde a época pombalina enquadrados, religiosa e socialmente pelas duas novas freguesias, de Santa Isabel e de S. Mamede, e por comunidades religiosas como as Trinas do Rato e N.a S.ra de Monserrate dos fabricantes da Seda.

Não se tendo construído a grande basílica patriarcal de D. João V, sua neta, D. Maria I, manda edificar, na velha área conventual da Estrela a última e magnífica igreja de Antigo Regime, a Basílica da Estrela, integrada em convento de Carmelitas.

A lógica da abertura ideológica iluminista, datável da época de Pombal e prosseguida pelo liberalismo, permitiu a construção da Igreja de S. Jorge dos Ingleses no velho cemitério dos estrangeiros perto da Estrela.

Lisboa é, na época de Pombal, o palco da luta entre um “Antigo Regime” agonizante e um proto-liberalismo que ergue ao palco social a burguesia, por interpostos instrumentos de “despotismos esclarecidos”, da “ilustração” dos espíritos, de “regalismos” centralizadores em luta contra “feudalismos” eclesiásticos.

O “regalismo” enuncia que o Rei é o representante de Deus na Terra, e está acima de todos, inclusive da Igreja. Aparentemente chega-se ao cume do centralismo régio. E no entanto, em meados do século XVIII o Marquês de Pombal convence ou aconselha o Rei a exilar-se, primeiro para a Ajuda e para Queluz (o monarca português irá, mais tarde, para o Brasil). O seu Palácio da Ribeira desaparece na época pombalina, e o próprio “Terreiro do Paço” é transformado em “Praça do Comércio”. Este é o segundo grande terremoto de Lisboa, o terremoto de índole política. O centralismo régio é, afinal, uma mera ritualização cortesã sem conteúdo real.

É a burguesia que emerge política e socialmente dos terremotos. O Marquês de Pombal, déspota iluminado, em muitos aspectos uma figura ainda de Antigo Regime, opera de certa forma a transferência de poderes para a burguesia emergente (Stephens, Ratton, etc.), que pagava no fundamental a reconstrução de Lisboa e para a qual foi edificada uma Baixa e suas praças, de espaços unificados pela racionalidade e pela “iluminação”. A mentalidade industrial, “produtiva” que essa nova burguesia iniciou era de facto um fenómeno novo. Tem pouco mais de dois séculos entre nós.

O “iluminismo”, ou “esclarecimento”, como entre nós se chamou, visa a descoberta dos mecanismos da natureza, desenvolve estudos de “Filosofia Natural” e investigação científica, mas faz parte do seu ideário a racionalidade do governo, o desenvolvimento da “Riqueza das Nações” e a racionalização económica. Não é por acaso que se desenvolve com Pombal um sistema produtivo de “indústrias” ou “artes”.

O pombalismo não termina com a “viradeira” da época de D. Maria I, nem com o processo que lhe é movido. A importância do capitalismo burguês não diminuiu em Lisboa depois do exílio de Pombal. As Academias e salões “esclarecidos” tiveram na Cidade um enorme surto no período pós-pombalino. Os colégios oratorianos forjaram, a partir do Convento do Espirito Santo da Pedreira ao Chiado, e do Hospício das Necessidades em Alcântara, mentalidades novas, chocaram, por assim dizer, o ovo do liberalismo.


A Lisboa Pombalina

26 de Setembro - Domingo à tarde - 1 bota.

Depois de termos percorrido quatro Lisboas espacialmente distintas, centramos agora o nosso percurso numa personalidade, Sebastião José de Carvalho e Melo, marquês de Pombal, que transformou Lisboa numa cidade da época moderna. Falaremos dele não só através da marca mais óbvia que deixou, a Baixa pombalina, mas do seu mundo privado, da educação que teve, dos ideais que serviu. Vamos encontrar esse mundo praticamente intacto e quase escondido entre a Rua do Século e o Largo do Rato.

Concentração: A hora e o local serão indicados aquando da inscrição no Clube.